domingo, 4 de julho de 2010

Os Golos do Cristiano!


Olá, meus queridos!
Confesso que não sou nenhuma fã de futebol, mas este ano foi impossível ficar indiferente. Este Mundial do futebol lá nas Áfricas foi a única coisa que me fez ter saudades do lar de idosos. Aquelas malditas vuvuzelas conseguem esfrangalhar-me a cabeça! Sempre que algum garotito mais atrevido começava a tocar uma daquelas cornetas ao pé de mim, era certo que ficava sem ela! Desengane-se quem pensa que as bengalas servem para nos ajudar a andar. São armas de defesa, pefeitas para açoites no rabo, rasteiras e partir vuvuzelas!
Entretanto, aquele Cristiano Reinaldo disse-me umas coisas que eu não percebi. E, sinceramente, é óbvio que ele também não. O resultado está à vista! Hum...
O gaiato é muito agradável à vista, definitivamente. Juro-vos que começo logo a ver melhor quando ele aparece na televisão. Mas não é disso que eu vos quero falar. As barbaridades que saiem daquela boca! E não me refiro à saliva que ele cuspia quando tinha aparelho! Ele, agora, já não tem aqueles arames nos dentes. Pois bem... Passo a explicar-me: O que é que foi aquela coisa do quetechape? Aliás, o que é o quetechape? O Cristiano disse que os golos eram como o quetechape: Custava a sair, mas depois nunca mais parava.
Meu filho: na minha terra, Casais da Desgraça, isso chama-se Prisão de Ventre, e cura-se com um bom laxante!
Ao que parece, o quetechape não resultou, porque só marcou aquele golito trapalhão no mesmo jogo em que toda a gente conseguiu marcar. O rapazito ainda andou de beicito pendurado com inveja dos outros meninos, porque todos marcavam golos menos ele. Mas finalmente lá se refez e enfiou a bola na baliza.
Diz-se que ele falhou e foi o responsável pela derrota portuguesa... E o rapazito rematou que se queriam saber quem era o culpado que falassem com o treinador. Ai! Eu pensei logo que ele andava a aprender com os franceses! Porém, rematou logo de seguida a pedir desculpas pelo mal entendido. Era só uma "inocente frase" sem outras intenções. Só queria dizer que o Queiroz estava a ser entrevistado na sala de imprensa e era com ele que os jornalistas deviam estar a falar. É óbvio! Coitadinho. Estava frustrado.
Dois remates seguidos, e nem um único golo, poderíamos nós pensar! Com uma boca destas, e reparem que não me dou ao trabalho de mencionar a sua inteligência, não seria de esperar outra coisa... Mas não! Estamos todos errados mais uma vez! Parece que o rapazito andou a golear, sim senhor! Mas noutra baliza! O rapazinho é pai! Enquanto andava a tentar golear no futebol, só pensava na criaturazinha que tinha acabado de nascer lá para as Américas, segundo dizem! Cristiano, Cristiano... Espero que o teu miudito tenha melhores professores do que tu! E larga o quetechape. Estás é a precisar de um bom laxante, filho!
Sinceramente,
Antonieta de Jesus Cristo-Rei no Céu e na Terra Aleluia Piriquita!

P.S.: Com isto tudo, não admira que a menina Paris Hilton, uma loira burra daquelas que parecem saídas de uma cadeia de montagem, tenha sido presa por andar a fumar aquelas ervas que os hippies fumavam depois do Sr. Marcelo Caetano ter sido despedido do governo. A rapariga devia estar a pensar «Que horror! Se calhar sou eu a mãe!». Podem não se lembrar, mas houve molho entre esses dois manjericos há um ano atrás. Olha, filha, não te preocupes. Com umas ancas como as tuas, nunca hás-de ter filhos. Uma mulher, para parir, tem que ter ancas largas para a criança pasar! E se fosses tu a mãe, já te tinhas apercebido, quando aparecesse nas revistas cor-de-rosa! Descansa em paz, na paz do Senhor!

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Faz as pazes com Deus, ó Saramago!

Meus queridos,
Eu sou uma pessoa que nos funerais tem sempre as mãos pousadas sobre o regaço e não pronuncia uma única palavra. Se alguém me começa a falar bem do morto, o mais certo é eu interromper «Descansa. Podes parar com a graxa. Está morto, já não te ouve.» e, se ouço alguém a chorar, eu sou aquela pessoa que diz «Shiu! O senhor prior está a falar!».
Eu não sou uma pessoa que chore nos funerais, ou que fale irritantemente sobre o quão adorável era o morto quando estava vivo. Que horror! Era o que mais me faltava! Eu não acredito em pessoas adoráveis. Ninguém o é! Todos têm nódoas na camisa! Eu sou aquela senhora, a Dona Antonieta, que passado algum tempo, quando já ninguém fala no morto e já toda a gente o esqueceu, começa a contar histórias sobre ele. Era o que me faltava, estar a engraxar um morto! Se não se fez enquanto estava vivo, já não se faz! Por isso, quando o Zé Saramago morreu, remeti-me ao meu silêncio e esperei que se esquecessem dele. Já passou uma semana, e agora, que já pararam de engraxar o morto e as atenções se voltaram todas para o futebol, lá nas Áfricas, posso pronunciar-me.
Quero lá eu saber que ele tenha ganho um prémio em terras de bárbaros nórdicos, ou que tenha escrito uma catrefada de livros. O Zé era um homem horrível que me atormentou desde pequenina. A minha aldeia, Casal da Desgraça, fica apenas a alguns quilómetros da Azinhaga, onde ele nasceu. Ele era mais lisboeta que ribatejano. Quando ele voltava à Azinhaga, toda a gente em Casal da Desgraça dizia que aquele rapaz era lisboeta. Nós conhecemo-nos quando eu tinha os meus seis aninhos e ele... sei lá eu... era mais velho... já tinha barba... Eu estava a caminho da capelinha de Nossa Senhora das Dores - que agora já foi demolida porque o telhado estava podre - quando o rapaz se cruza comigo e chocamos. Pediu-me desculpa, eu também, e conforme ele se ia embora eu despedi-me com um «Vai com Deus!», ao que ele me responde «Deus não existe!». Chorei tanto, Meu deus! Chorei tanto! Passei o terço todo a chorar. Rezei o terço três vezes a ver se me esquecia do que ele me tinha dito, mas não conseguia. Levei dois dias a recuperar.
Depois disso, estive muito tempo sem o ver, até me casar com o meu Arnaldo, Deus o tenha em paz, e nos mudarmos para Lisboa. Ora, o meu Arnaldo era bom amigo do Zé Saramago e eu, na altura, já nem me lembrava dele, até que um dia, ao jantar, convidei a querida Ilda, a mulher dele, a quem eu emprestei uma tesoura de poda que ela nunca mais me devolveu, a ir à missa no dia seguinte, e a levar a pequenina Violante também, para conhecer as outras senhoras da vizinhança e as criancinhas da catequese, ao que ele interrompeu, dizendo «Não acredito no tempo que as pessoas perdem a rezar a um Deus que não existe!» Lembrei-me logo dele! Que escândalo! Até parti um prato!
Nessa noite, ele mostrou ao meu Arnaldo um manuscrito de um livro chamado "A Viuva", que ele próprio tinha escrito... Queria publicá-lo em breve! Um dia, sem que o meu Arnaldo soubesse, li o manuscrito e fiquei horrorizada. Telefonei para a editora e disse-lhes que era um livro horrível e mais valia ser chamado "Terra do Pecado"! Tramei-o bem tramado. O livro foi publicado na mesma, mas alteraram-lhe o título. Depois disso, ainda escreveu um livro chamado "Claraboia" e eu decidi repetir a brincadeira. Estava à espera que o contrariassem novamente e também mudassem o título do livro para "Pouca Vergonha". Porém, em vez disso, não o publicaram...
Só dezanove anos depois é que ele voltou a escrever, quando o meu Arnaldo se descuidou e lhe disse que tinha sido por minha culpa que o "Claraboia" não tinha sido publicado... O Zé riu-se que nem um perdido e parece que ficou logo inspirado. Escreveu uns "Poemas Possíveis" e pediu-me para os ler. «Pára de escrever, Zé Saramago! Que o diabo te carregue! Pára de me massacrar, que o único livro que uma senhora como eu devia ler é a bíblia!» Mas ele insistiu. Ralhei tanto com ele que a besta do homem ficou a adorar-me. A partir daí passou sempre a mandar-me os seus manuscritos. Até parecia excitar-se por eu me enfurecer tanto.
Decidi mudar de técnica. Depois da "História do Cerco de Lisboa", disse-lhe «Olha, Zé. O livro é assim-assim.» Ele franziu o sobrolho e estranhou a minha simpatia. «Por que é que não tentas fazer uma daquelas histórias bonitas, como as do Livro Sagrado? Também têm pessoas sem moral e coisas esquisitas a acontecer...» Ele pareceu convencido e pouco depois mostrou-me aquela abominação, "O Evangelho Segundo Jesus Cristo"! Como é que ele foi capaz?! Que horror! E o pior é que me sinto culpada por ele ter publicado o livro. Se eu tivesse sido simpática em vez de o ameaçar com a faca de cortar o pão, ele teria guardado o livro na gaveta. Por que é que eu o tentei matar com a faca de cortar o pão?! Sinto-me culpada até aos dias de hoje...
De qualquer forma, pior para ele, que se mudou para a Espanha! Mas nem mesmo lá longe deixou de me enviar aqueles manuscritos demoníacos. Bastaria que eu não os lesse e ele pararia de me atormentar! E eu ser capaz? Não era! De cada vez que recebia um manuscrito dele, eu ficava com ele dois dias sobre a mesa, tentando ganhar coragem para o atirar à fogueira. E, então, eu pensava «Calma, Antonieta! Se fazes isso, ele pensa que leste o livro e o detestaste mais do que aos outros!» E lá ia eu ler aquelas barbaridades sob a luz do candeeiro, para depois lhe escrever uma carta com todos os impropérios de que me conseguia lembrar!
Por cada vez que li um livro dele, voltei a ler a bíblia toda do génesis ao apocalipse, como que a pedir perdão a Deus Nosso Senhor. Finalmente, depois de ter cegado a humanidade inteira e de ter transformado a morte numa mulher, decidiu chamar filho da puta a Deus e dessa vez enfureci-me de tal forma que queimei mesmo o manuscrito e enviei-lhe as cinzas por correio. E não é que o velho rezingão também publicou aquele absurdo?
Enfim, agora ele morreu. Entretanto, já li a Bíblia outra vez e tenho a sensação de estar à espera que qualquer dia me apareça outro manuscrito cá em casa... Ouvi dizer que aquele rapazinho que me cumprimenta todos os dias quando vai para a faculdade aqui ao lado gosta de escrever... Talvez, um dia, me deixe ler um dos seus manuscritos...

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Dona Antonieta está de volta!


Meus queridos! Tantas saudades que eu tive de partilhar os meus dias convosco... Depois dos pequenos incidentes com a X-Box de há uns meses atrás, os meus filhos pensaram «A mamã está a ficar muito solitária e isso já não é bom na idade dela. Devíamos enfiá-la num LAR, COM OUTROS VELHINHOS CAQUÉTICOS COMO ELA!» A mim, Antonieta de Jesus Cristo-Rei no Céu e na Terra Aleluia Piriquita! Como é que foram capazes? Eu que sempre fiz a minha vida sem ajuda de ninguém, sempre tive a minha casa e lutei pelas minhas coisas! Até os meus bibelôs! A quantidade de vezes que lutei com aquela vaca da Josefa (que ainda não voltou do Brasil) pelos bibelôs que agora enfeitam os meus móveis! Consegui vencê-la sempre! Ela nunca comprou um bibelô que eu quisesse comprar!

Continuando... Eles levaram-me para um lar (supostamente) de luxo, com muitas regalias e muitos velhinhos com quem eu poderia conversar, mas aquilo era uma treta pegada! A maioria dos velhinhos nem falavam! Babavam-se! E aquilo não tinha luxo nenhum, se é que chamam luxo a eu ter o meu próprio quarto e uma casa de banho privada! A isso eu não chamo luxo! Chamo "o mínimo aceitável" para uma senhora como eu! Não vivi estes anos todos para me atirarem areia para os olhos!

Seja como for, lá conhecia a Julieta, uma grande coscuvilheira, mas boa amiga. Podíamos passar horas a conversar. E como o lar tinha muita gente, não era difícil arranjarmos motivo de conversa. Havia sempre os podres de alguém, os boatos deste e daquele... e como ela já lá estava há dois anos, conhecia também muitos outros que também por lá tinham passado, mas que já não se encontravam entre nós. Infelizmente, descobri mais tarde que metade das histórias eram falsas e que da mesma forma que ela falava comigo sobre os outros, falava com os outros sobre mim. Claro que ela não se ficou a rir, quando passaram no noticiário que se tinham casado duas lésbicas em Portugal (o Demo anda ocupado...) e eu me levantei-me e disse, diante de todos, alto e bom som, que uma delas era filha da Julieta!

Perdi uma amiga e ganhei muitas mais. É como na escola. Assim que mostrei que com a Antonieta não se brinca, tornei-me popular. Até tive os meus interesses amorosos. O Manuel Fonseca era muito galante, mas estava tão gordo, valha-me Deus... E o Alberto Silva também era um senhor com H grande (e não só, pelo que as enfermeiras davam a entender com os seus borborinhos, de cada vez que o ajudavam a tomar banho), mas era careca e faltavam-lhe dois dentes na dentadura... O Norberto também era encantador e sabedor na arte do engate, mas era casado e a mulher dele também habitava aquele lar. Lá por a mulher dele estar em coma, o casamento não deixa de ser sagrado...

Todavia, o meu Zé, o meu filho mais velho, foi despedido, e era ele que pagava a minha estadia neste "lar de luxo". Acontece que não é o meu único "filho despedido" e assim já não havia dinheiro para a mamã estar "internada" naquela espécie de hospício infernal onde me obrigavam a comer canja dia-sim-dia-não e a comer gelatina de pêssego quando o que eu queria era a de ananás.

Estou de volta, meus queridos! Estou em casa. O gato Matias foi quem sentiu mais a minha falta. Tão magrinho que ele está, depois de ter enchido a barriga a todas as gatas da vizinhança. Depois a dona é que tem de ouvir a Gertrudes a gritar porque a gatinha dela está prenha outra vez. Mas não faz mal. Agora, a Antonieta está de volta!

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

O Exorcismo - e o fantasma da X-Box

Meus Queridos,
Perdoem-me a minha ausência. Sinto-me tão perdida. Já não sei o que faça da minha vida. Acho que estou a morrer. Como Sylvia Plath dizia, todos nós começamos a morrer a partir do momento em que nascemos, mas desta vez sei que estou mais perto de estar morta do que no dia em que nasci. Assombrada durante a noite e possuída durante o dia, passei quase um mês sem dormir. Sinto-me seca por dentro, como um pão que vai ao microondas durante demasiado tempo.
A minha artrite dá-me cabo dos dedos, mas nem por isso conseguia largar a consola. Inicialmente, comprei aquela porcaria para o gato Matias, porque ele estava de trombas e já não gostava de mim. Contudo, como o Matias não jogava, comecei eu a dar uso à coisa. Depois, apareceram aqueles suspiros e gemidos no meu quarto e tirei a fotografia àquele jovem espectro que me assombrava com aqueles olhos de quem me queria possuir. Pelo aspecto, devia ser um jovem fantasma com uns 18 anos, mais coisa, menos coisa. Agora, não percebo por que decidiu assombrar-me. E acho que ele me possuiu, de facto, porque os jovens, mesmo fantasmas, adoram jogar e eu não largava a consola nem por nada e os meus dedos continuam todos inflamados.

Eu nem sequer gosto de futebol e não parava de jogar Pro-Evolution Soccer 2010! E aqueles monstros aterrorizantes do Halo que me estavam sempre a matar e me provocavam aqueles pesadelos horripilantes! Estive quase um mês sem fazer as lides da casa, sem comer, sem me lavar, nada! As minhas vizinhas pensavam que eu estava a viver em casa dos meus filhos, porque nunca me viam sair de casa. Como é que pode ser? Estive quase um mês sem saber nada da vizinhança! Todas as conversas, brigas, coscuvilhices e segredinhos que eu perdi! À noite, quando tentava dormir qualquer coisa, lá aparecia o safardana do fantasma para me suspirar ao ouvido e me acordar. «Vai jogar, Antonieta! Ainda não chegaste ao último nível!» E eu limitava-me a obedecer, como se o meu próprio espírito já não habitasse mais em mim. O gato Matias já nem me reconhecia. Rugia de cada vez que me via!

Só quando a Celeste e o Senhor Padre vieram a minha casa, porque há já três semanas que eu não ia à missa, é que me livrei do fantasma que me tomava o corpo. Os rostos deles foram tomados de assombro quando mergulharam na obscuridade da minha sala e me viram.

- Dona Antonieta, vocemessê está num estado miserável. Largue a televisão. Precisa de se lavar, de comer...

- Estás a chamar-me porca, padre? Vai mas é para o Inferno chupar pichas com a tua mãe!

A Celeste até desmaiou! Nunca da minha boca tinham saído tais impropérios! Eu gritava e ralhava com eles até que o padre arrastou a Celeste dali para fora e foi chamar o bispo. Entretanto, depois de recuperar os sentidos, a Celeste foi pedir ajuda à pobre Lucinda, a qual, graças às suas cataratas, consegue ver o "outro mundo" com outros olhos.

Quando entraram em casa, plantaram velas por todo o lado e arrancaram-me o comando das mãos!

- Não!!! - Gritei eu, com uma voz que não era a minha. - Não gravei o último nível! Vou perder o jogo!

- O Poder de Deus Compele-te! O Poder de Deus Compele-te!

- Não me chateiem, seus bastardos, filhos de uma grande meretriz!

Foi então que amarraram ao sofá e atiraram a minha X-Box 360 para a lareira, desaparecendo por entre as chamas e o fumo negro do Inferno que encheu aquela casa. E enquanto exorcitavam aquele espírito maligno de dentro de mim, eu gritava e grunhia e cuspia e chamei-lhes nomes que nunca tinha ouvido na minha vida! A partir daí, não me lembro de mais nada. Parece que destrui a minha mesa de vidro da sala, uma moldura da minha querida Olívia, um retrato de Nosso Senhor Jesus Cristo na Cruz e até mesmo o tampo da sanita! Depois, quando finalmente conseguiram que o demónio me libertasse, vomitei no lavatório até as tripas me arderem!

Agora, estou melhor. O Senhor Padre pediu às senhoras da Santa Casa da Misericórdia para me ajudarem durante uns dias. Elas podiam lavar-me a casa, trazer-me refeições, dar-me banho... Mas eu mandei-as embora, logo no primeiro dia! Trouxeram-me canja e queriam que eu me despisse à frente delas para me lavarem. Isso eu consigo fazer sozinha! Se me queriam ajudar, levassem-me para as termas e servissem-me caviar!

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

O Matias, a X-Box e o Fantasma...

Meus queridos, já não sei o que fazer. O Matias zangou-se comigo. Eu devia tê-lo levado comigo para o Réveillon. Porém, em vez disso, pensei que ele se ia divertir mais com os amigos e soltei-o. Claro que, como só voltei passados alguns dias, o gato já cospia fogo pelas ventas e estava incrivelmente revoltado comigo. Nunca mais me falou. Dei-lhe pasta de atum, os camarões que roubei à minha nora, até lhe comprei fígado, que o bichano tanto adora. E nada! Nada o fez voltar a ser como era!
Assim, um dia desta semana, a Celeste disse-me que tinha comprado uma daquelas consolas barulhentas para os netos. Aquelas pestes são horríveis! Horríveis! Só vão ter com a avó pelos anos e pelo Natal! Parecem ter saído da minha família... Mas ela continuou a história, e ao que parece ela ofereceu-lhes essa coisa ruidosa para eles ficarem especados à frente da televisão como se fossem uns tontinhos, mas na condição de esta ficar lá em casa dela. A partir daí, todos os dias, depois da escola, as pestinhas vão para casa da avó. Ao início nem lhe ligavam, mas como ela lhes foi preparando uns lanches e uns bolinhos (aquela mulher faz uns bolos quase melhores que os meus... quase!) agora a avó é quase a melhor amiga deles.
Decidi, então, usar a mesma estratégia. Comprei uma consola para o Matias! Mas até agora parece não estar a surtir efeito. Já comecei a mexer naquilo, a ver se lhe faço inveja, mas sou muito má com estas coisas, e o gato continua a ignorar-me.
Entretanto, como o Matias já não dorme comigo e não adormeço com o ronronar dele aos meus ouvidos, comecei a ouvir os ruídos mais estranhos durante a noite. São de arrepiar. Começava por sentir uma presença, apenas, mas pensei que fosse tudo da minha imaginação. Nos dias seguintes, foram os afrontamentos! Credo! Tanto calor! Insuportável. Transpirava-me toda, até tinha que despir a combinação que ficava toda ensopada em suor. Finalmente, de há uma semana para cá, vieram os suspiros. Meu Deus! Se fosse uma galinha, tinha largado um ovo no preciso momento em que ouvi aquilo pela primeira vez! Que susto! Nossa Senhora dos Aflitos nos proteja a todos de uma presença que suspire daquela maneira no nosso quarto!
Decidi contar essa história à minha Olívia, ante-ontem, quando ela veio cá surripiar-me o almoço, porque parece que se zangou com a fufa Diana, com quem já andava a almoçar todos os dias... Valha-nos Deus! Pode ser que a coisa lhe passe e o Demo abandone aquele corpo!
Continuando, a minha neta, toda miserável e chorosa por causa da amiga traidora (ela não mo disse, mas eu sei que foi por isso. Aquelas lágrimas não enganam ninguém. Parece uma porquinha toda inchada e ranhosa quando está desgostosa de amores), disse-me que a melhor maneira de ver se havia alguém a assombrar-me o quarto era dar-me uma máquina fotográfica, para eu apanhar a Besta em flagrante quando começasse a perturbar-me o sono! Claro! O que ela estava à espera era que eu fotografasse a parede ou o tecto e pronto - a avózinha anda a ouvir coisas. Vamos interná-la e fazer as partilhas.
Mas não! Adormeci com a máquina fotográfica nas mãos e quando ouvi aquele sussurro outra vez, saquei do aparelho e Zás! Apanhei a criatura demoníaca mesmo a olhar para mim. Meu Deus! Os arrepios que me dá! Tenho uma aparição nua no meu quarto a assombrar-me os sonhos! Nossa Senhora dos Aflitos me proteja, que já não sei aguento mais destes afrontamentos...

Sinceramente,
Antonieta de Jesus Cristo-Rei no Céu e na Terra Aleluia Piriquita!

sábado, 16 de janeiro de 2010

Festas! O meu Réveillon 2010!

Como já vos disse na semana passada, as minhas últimas semanas de 2009 foram muito desgastantes. Ainda estou a recuperar. Nem sei como é que me aguentei de pé. Estive quase para pedir uma bengala pelo Natal, mas no meu íntimo desejava ainda mais que me dessem uma camisa de seda igual à da Celeste, pelo que me deixei ficar calada. Erro meu! Deram-me naprons franceses, toalhas de banho de linho egípcio, jarras de cristal para as flores dos meus canteiros! E tudo o que eu queria era uma camisa de seda como a da Celeste! Até parece que é muito difícil comprar prendas para senhoras da minha idade...
Depois do Natal, o meu querido neto Ricardo (o único que eu não consegui casar porque foi enfeitiçado por uma bruxa africana, com quem se casou e teve dois meninos mestiços, para tão grande desgosto da minha pessoa) convidou-me a ir passar o resto da semana seguinte para casa dele, para que aqueles meus bisnetos escurinhos ficassem a conhecer melhor a bisavó.
Uma semana infernal! As criaturinhas, a Anita e o Leo, de quatro e sete anos, estavam sempre a brincar aos soldados, com armas de plástico e espadas! Depois, pediam-me para eu brincar com eles. E eu até brincava, ria quase até chorar de tanto me divertir, mas era só porque eles me pediam! Tratavam-me por Avó Piriquita e adoravam os bolos que eu lhes fazia todos os dias. Fiquei a conhecer melhor a bruxeza, também, que se chama Naima-Qualquer-Coisa-Ding-Dong, que nunca queria que eu me cansasse a tentar arrumar-lhe a casa. Ela tratava de tudo! Trabalhava até às quatro da tarde e quando chegava a casa, arrumava, varria, lavava... Tudo, tudo, tudo, em menos de duas horas. Depois, acalmava os filhotes, metia-os a ler (e deviam ver a mais pequenina que ainda nem anda na escola e já lê tão bem), conversava comigo durante meia-hora e ia para a cozinha fazer o jantar para nós todos. Impressionante! Eu ainda tentava ensiná-la a cozinhar à minha maneira, mas ela enviava-me para a minha poltrona na sala e dizia que eu era a convidada e devia descansar... Não admira que antigamente fossem tão bons escravos! A mulher trabalha que se desalma! O meu neto Ricardo, se calhar, até nem fez muito mal em casar-se com aquela alma das Áfricas... Apesar de tudo, era uma mulher quase perfeita. Mas eu tenho a certeza que lhe conseguia arranjar uma mulher melhor!
Finalmente, chegou o fim do ano e eu já tremia que nem varas verdes, com medo do que podia acontecer à meia-noite, com aquele fogo de artifício e tudo... A família reuniu-se toda, outra vez, trouxeram champagne, doces, marisco (outra vez a minha nora a tentar matar-me, por causa da minha alergia ao marisco), lombo de porco e tantas, tantas iguarias, Meu Deus! Olhasse fosse para que lado fosse, ou via pessoas, ou via comida! Eram tantas gargalhadas, gritos, gente a falar alto e música aos berros! Nunca vi nada assim! O meu Arnaldo podia ter gostado de uma coisa destas, se ainda estivesse vivo, Deus tenha a sua alma em repouso. Contudo, para mim aquilo era uma barulheira que me punha a cabeça em frangalhos! E de repente...
PUM! PUM!
Começaram a rebentar bombas na rua, assim, do nada! Toda a gente a gritar e a correr para a rua e as criancinhas em pânico eram as que fugiam mais depressa! Tínhamos acabado de entrar em 2010 e dos meus olhos escorriam lágrimas de pesar pelas nossas vidas que tinham chegado ao fim! Não podia acreditar que era assim que ia ser a minha morte! E então pensei: «Antonieta Piriquita, acalma-te. Pelo menos assim não ficas sozinha no Céu, à espera do resto da família. Vão todos juntos, de uma só vez!» E comecei logo a sorrir.
Quando me levaram lá para fora, toda a gente bebia champanhe e abraçava-se e depois davam-me beijinhos a dizer: «Coitadinha da avó, está a chorar de alegria!» E era verdade, estava. Mas como nunca mais morriamos, olhei para o céu, para ver se as bombas ainda estavam muito longe, e foi aí que me apercebi que era só o fogo de artifício. Aí, fiquei brava! Os meus filhos tiveram que me agarrar! Eu queria matar os filhos da mãe que estavam a lançar os foguetes! Quase me tinham matado de susto! Eu tinha sido enganada!
Depois, sentaram-me numa cadeira, deram-me uns copos de champanhe para eu me acalmar e passas para eu não beber aquilo sem nada no bucho e a noite acabou por se tornar maravilhosa. Ficou tudo mais calmo e lento e eu fiquei toda relachada e descontraída. Fazia muito frio, na rua, mas eu até que estava cheia de calor e meti-me a dançar com os meus bisnetos... 2009 foi horrível e 2010 começou ainda pior. Todavia, Deus escreve torto por linhas direitas, e tudo se compôs com uns copos de champanhe. Foi uma maravilha e este ano adivinha-se cheio de surpresas.
Uma vez mais, Feliz 2010, meus queridos amigos que eu não conheço. Que Nosso Senhor vos guarde na sua infinita... Hip!... Qualquer coisa!
Sinceramente,
Antonieta de Jesus Cristo-Rei no Céu e na Terra Aleluia Piriquita!

domingo, 10 de janeiro de 2010

Festas! O meu dia de Natal...


Meus Queridos! Devem ser as únicas pessoas que me adoram! Desculpem-me ter estado afastada de vós durante tanto tempo! Estas festas todas são demais para uma senhora de idade como eu, que sofro tanto da minha saúde. Todavia, primeiro que tudo: Um Glorioso Ano Novo para todos, na paz do Senhor, com muita luz e com Jesus nos corações.

Nem vão acreditar nas minhas desventuras, ao longo das últimas semanas. Depois de todas aquelas tempestades, que quase me fizeram pensar que 2012 tinha chegado e ia conhecer o Senhor, tive dois dias para limpar a casa, completamente sozinha, com a fraca ajuda da minha Olívia, e deixar tudo pronto para o Natal, porque os meus filhos queriam que a família se juntasse toda lá para celebrar as festas e a casa da mamã é maior que as deles. Tantas limpezas deixaram-me os bafos de fora. A Olívia varreu-me o chão todo e lavou-o e eu tinha que ir sempre atrás dela, porque a rapariga é muito pouco dotada para dona-de-casa e ficava tudo sujo na mesma. Nem as minhas estatuetas de Nossa Senhora dos Aflitos ela sabia limpar bem e arrumar no sítio certo dos móveis. E os cortinados que ela queria que eu pendurasse na janela da cozinha! Que horror! Tive que esperar até a rapariga sair de casa para os trocar. Estava sempre a mandar-me sentar, que não queria que eu me cansasse e que ela era muito bem capaz de tomar conta do recado e tratar da minha casa sozinha. Mas se não fosse eu, aquilo nunca tinha ficado pronto para o Natal. O que ela não queria era que eu a estivesse a tentar ensinar a cuidar da casa, como uma senhora deve ser. Eu, que sou uma avó tão preocupada, calhou-me uma neta que não sabe dar valor ao que eu lhe tento ensinar todos os dias. Porém, ainda não disse tudo!

Mal consegui dormir na noite de 24 para 25. Depois daquela Consoada que a minha nora preparou, tão desleixada... Se há coisa de que eu me arrependo é de ter deixado o meu filho mais velho casar-se com aquela mulher. É bondosa e muito fértil... Mas não sabe cozinhar! Parece impossível! O bacalhau era seco e não tinha sabor. As batatas estavam cruas e serviu-nos marisco para as entradas! Marisco! Queria matar-me! Até parece que não sabia que eu era alérgica ao marisco! Gritava comigo para eu não comer os camarões e punha-me um pratinho com queijinhos ao colo para eu comer. E de cada vez que eu me enganava no prato e pegava num camarãozinho, lá vinha ela aos gritos, a dizer que eu não os podia comer! Se eu não os podia comer, por que é que ela os tinha comprado para a Consoada? Era para me matar! Só podia ser por isso...

Depois de me ter enchido de nervos, empanturrei-me com sonhos e rabanadas e tive pesadelos toda a madrugada. Quando, finalmente consegui adormecer, acordei com os gritos dos meus trezentos bisnetos. Tanta criançada, Credo! Nem sei o nome deles! Chamo-lhes meninos queridos e eles pensam que gosto deles, mas mal os conheço, porque os pais nunca me vêm visitar. Só na altura de lhes comprar prendas. Contudo, como eu nunca sei quando é que as criaturinhas fazem anos, tenho uma caixa cheia de peluches por baixo da cama para oferecer quando eles me visitam. Seja como for, eles estavam a gritar por causa do Pai Natal. Ele tinha-lhes levado presentes durante a noite!

Ai, se eu detesto o São Nicolau! Esse homem não era santo nenhum! Roubou o dia de aniversário do menino Jesus, e só se fala no velho de barbas que dá presentes! Na minha terra, o velho de barbas que dava presentes era o Sr. Agostino, que tinha muito más intenções e teve que ser imasculado para deixar as crianças em paz. Levantei-me da cama em combinação e saí para a sala para lhes ensinar que era o dia de Jesus e não o do Pai Natal, mas as crianças começaram a gritar assustadíssimas quando olharam para mim e as minhas filhas levaram-me novamente para dentro do quarto para me vestirem e porem-me decente para as festas.

Tivemos que comer um perú recheado que tinha um molho que a minha nora inventou. Toda a gente gabou aquele molho, mas cá para mim aquilo era só aguardente para nos embebedar a todos. E doces, todo o santo dia! E cházinhos! E o berreiro daquelas criaturas pequenas com os seus brinquedos barulhentos! E visitas! Sempre a aparecer gente que dizia que me conhecia, mas que eu nunca tinha visto na vida. Claro que fui simpática para toda a gente e disse sempre «Ah, sim! Eu lembro-me de ti quando eras pequeno... És aquele que me vinha roubar as laranjas do meu quintal!» ou então «Ah, sim! Eu lembro-me de ti quando eras pequena... És aquela que corria em cuecas no recreio da escola!» Toda a gente se ria muito e deixavam-me em paz.

Entretanto, como estava cheia de comida até ao pescoço e estava cansada de tanta confusão, decidi que estava a precisar de dormir uma sesta e adormeci no sofá... Até que fui acordada pela voz da minha Olívia a dizer:

- Já viram a boca dela? A velha morreu ou está a dormir?

Teve muita sorte, por estarmos no Natal. Estive quase para a tirar do meu testamento. Contudo, em vez disso, limitei-me a murmurar, ainda de olhos fechados:

- Posso parecer uma morta a dormir, mas pelo menos a minha pachacha funciona!

Posso ter deixado a criatura a chorar, e os meus filhos a ralharem comigo, e os meus bisnetos a perguntarem aos pais e à Olívia o que era uma pachacha, mas acabei o Natal a rir-me que nem uma perdida.

Sinceramente,

Antonieta de Jesus Cristo-Rei no Céu e na Terra Aleluia Piriquita!